sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Um dia a correria pode mudar



Tudo é diferente. Os pássaros cantam, os bois andam pelo pasto. Ela, sempre ela, fica sentada na sua varanda olhando o horizonte clarear e escurecer. Imagina você, em pleno século 21, viver desconectado de tecnologias e computador. Não tem perfil no Facebook e nunca teve aparelho celular na vida! Parece irreal, não é? Pois toda regra tem exceção.

-Oi Franklin, como vai meu amigo?
- Estou bem minha amiga e você?
- Vou vivendo. Ainda no jornalismo, mas só que na roça.
- Na roça? - questiono.
- É, procurei ficar na fazendo do meu pai, sem telefone e sem celular.
- O quê? - fico pasmo.

Ontem encontrei com uma amiga que formou comigo em jornalismo na Unilago e atualmente mora na Fazendo do seu pai, em Aparecida do Taboado, Mato Grosso do Sul. Chama Claúdia Araújo. Tem 38 anos, é jornalista e trabalha com o computador da lan-house da cidade. Volta e meia entrega um texto sobre Natureza e Astrologia – material para ela, no meio daquele verde hippye, é o que não falta. Loira, de 1,74 metro, só tem conta de e-mail.

De vez em quando ela vem aparecer por São Paulo. Vem visitar a família e outros amigos. Como de costume, ela vai embora assustada e amaldiçoando a nossa terra: não entende a correria, a gritaria, o agito e a velocidade de tudo.

- Eu não sei como vocês conseguem viver assim! Fico muito estressada. Eu prefiro ficar no meio do mato com uma pauta ali, outra aqui.

Ela tem pressa em regressar à sua horta e capinar, que é o que ela mais gosta. E as galinhas as esperam felizes ou acabam ficando tristes e a produção dos ovos cai.

Ah, esqueci de contar. Ela não tem luz elétrica em casa. Não por opção, mas porque não instalaram mesmo. Logo, ela acompanha a luz do sol e faz as coisas à mercê dele. Quando o dia começa, ela começa também. Geralmente, levanta às 5h30, todos os dias. Toma o seu café reforçado na varanda da casa simples onde mora, observa os bichos e vai para o campo.

Ela me contou que em todo amanhecer os tucanos vêm fuçar os ovos dos outros pássaros e todos fazem um barulho danado. Que tem uns três tipos de macacos diferentes que estão sempre por lá – Também conta que fica espertas devido ao número de cobras e ainda não chega perto de alguns cavalos selvagens, que já começara a ficar mais íntimos.

Cláudia ainda fala que os gaviões comem as cobras das quais têm medo. “Eles saem voando com elas no bico, e elas lutam para sobreviver.”

A Claudinha, como era chamada, observa por vários dias os movimentos do urubus. Inclusive, ela que me contou que eles chegam muito alto, pra cima das nuvens para fazer a digestão. “Esses dias fiquei olhando os urubus para ver se eles achavam a Belinha, minha cachorra de estimação que despareceu e, provavelmente, foi morta por uma cobra no meio do mato.”

Disse pra mim também que o galinheiro do vizinho foi todo destruído, e que provavelmente foi obra da onça. “Os lobos do mato, eu só vi uma vez, mas foi legal.”

Agora, não pude deixar de ficar lisonjeado quando ela me contou sobre as cachoeiras, do café que ela toma na casa de uma comadre toda tarde a partir das 16 horas. “Faço comida no forno à lenha”, diz sorrindo.
Logo vem o pensamento: “Forno a lenha?”. Hoje, eu só consigo viver de comidas enlatadas ou congeladas, e não pode faltar o microondas.

Em um determinado momento do papo, achei tudo aquilo muito surreal. De repente, acordo querendo continuar a conversa com Cláudia, essa amiga fictícia que me fez acreditar que posso ser jornalista, longe dessa correria do dia a dia. Bom, agora, deixa eu aprender mexer no Skype. Afinal, tenho que viver minha própria realidade.

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